terça-feira, 20 de dezembro de 2011
DR SÓCRATES
Sou são-paulino, não sou afeito a
purpurinas( nada contra desde que
purpurinem-se com respeito), mas aprecio cerveja, mulher e com moderação,
o carnaval.
Não sou populista, pois se assim
fosse estaria apenas fazendo menção do dr Sócrates pela perda, no vazio da sua
presença instigante e pela popularidade que isso poderia trazer. Por que iria
fazer uma crônica sobre o dr, nestes aspectos, se sou são- paulino?
Já disse que não sou corinthiano,
mas tento respeitar todos os times e
suas torcidas e todas as religiões. Acho que
o motivo maior em respeitar o
diferente é aprender com as diferenças o que não é nada fácil.
Sócrates poderia ter o epíteto em
sua essência de corinthiano- mor, o maior, ou um das maiores figuras do
Corinthians de todos os tempos e do
futebol brasileiro.
Eu tinha pouca idade quando
Sócrates jogava. E me lembro das jogadas típicas deste gênio-não há adjetivo melhor-gênio dentro do campo e
fora.
Não direi das jogadas erradas com
a sua saúde, embora fosse médico e consciente do que poderia acontecer se
procedesse da forma que procedeu. Não estou aqui para julgá-lo( como fez um
jornaleco de uma dessas corrente que se diz cristã, que muito me indignou, com uma matéria sobre Sócrates e sua doença, que
tinha em letras garrafais: “E AGORA DR?...”)
Sócrates foi a principal figura
da Democracia Corinthiana, exemplo maior da politização que envolveu o
Corinthians e por conseguinte toda a
sociedade brasileira na década de oitenta, com a abertura e o final da ditadura
militar. É inesquecível sua participação nos comícios-monstro das diretas.
Todos queriam aspirar ao ar de liberdade e queriam escolher o rumo e o caminho a seguir. Ele nunca se omitiu.
Esteve engajado dentro de campo com seus toques fabulosos de calcanhar que o
imortolizaram( para muitas vezes até humilhar meu time, o São Paulo, em
especial em 1983- na final do campeonato paulista), assim como seu
posicionamento político fazendo dar vazão à voz dos jogadores, principais
atores no espetáculo do futebol.
Quando o dr Sócrates jogava
dava a nítida impressão que haveria algo
saboroso saído de seus pés e de sua Inteligência. E vinha, seja um lançamento cortante, ou manso,
um petardo de fora da área. Lembro-me na Copa de 82, na Espanha, no gol que fez Éder quando o doutor deixou a bola passar por entre suas pernas para que
fizesse o gol, um chutaço que venceu o grande Dassayev, da então URSS...E o
Brasil venceu o time russo por dois a um, com destaque também para o gol da
URSS onde um jogador( não sei mais o nome) chutou de longe e o Valdir Peres,
que era goleiro do São Paulo, entregou –se com a bola passando por entre suas
pernas de forma vergonhosa...
Mas o São Paulo e o Corinthians
estão ligados por laços consaguíneos. É que nosso maior ídolo, modernamente
falando, o Raí, era irmão do dr. Estilos
muito diferentes, mas a marca de genialidade os unia. Com Raí o time tricolor paulista
foi imbatível, ganhando tudo sob a batuta do mestre Telê Santana, no começo da
década de 90. Com Sócrates o Corinthians se não ganhou tudo deixou uma marca
indelével na história do time. E do futebol brasileiro.
Raí era forte, contrastando com a
figura vertical e elegante de Sócrates. Mas é na força física que Raí conseguiu
se sobrepor ao gênio franzino do dr. Raí
era disciplinado, o dr nunca foi. Raí decisivamente tomou para si a
responsabilidade de levar o time ao topo. O dr também, só que com um time que
causava inveja aos jogadores e técnicos dos nossos brasileirões, pobres campeonatos brasileiros contemporâneos.
Talvez, hoje, seja o Santos que tenha uma equipe muito bem construída e
organicamente coesa, com o jovem Neymar
despontando agora com suas jogadas de encher os olhos. Mas isto é matéria de
uma outra crônica.
O dr Sócrates rompeu com
paradigmas aliando o esporte à política. Tinha opinião, não era uma massa
informe e amorfa que se refastelava nos bordões dos jogadores. Opinava e
criticava com arguta sabedoria e com humor ácido, sobre futebol e o que fosse.
Homônimo do filósofo grego Sócrates, nunca o nome foi tão bem escolhido em ser usado para este homem, corinthiano de coração e
aberto às possibilidades de discussão de ideias dentro de uma inteligência viva
e penetrante. Nosso Sócrates deixa-nos com a nítida impressão de que pensamento
e futebol, um e outro, precisam andar juntos no metier do jogo da bola. E
fora dela, também. Se isso for possível ainda.
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
NOITE, TEXTURAS ENTRE PELE E DEDOS
Mesmo
alquebrado,
Com a boca em chamas
Uivando
da noite grande,
O
orixá pega o meu primeiro filho
E mandou
– o para as cavernas de Ninrode.
Depois
Iemanjá canta da vida na água
E
faz do coro de seu nome azul, o vento
Que
descarrega as palmas das mãos em brancuras solenes.
Negra, negra como a noite
Como a vida de Sunamita.
Como o portal de Elifaz...
Esta
negra que rega as plantas com seus olhos negros,
E
como negra refaz no seu corpo
Minhas
esculturas nas alturas das areias...
Noite, noite
Que se transfigura
As sobras em chuvas dos orixás.
Xangô,
quis retumbar os raios nos batuques de amanhã.
E
então a beleza negra deu um sorriso e chamou-me na amplidão.
Reconhecendo
o seu tempero
Na
medida exata de minha fome intensa
Em
amá-la com atenção, carne, e visões.
Negra, negra, como a noite
Que manhã nascerá na tua chuva
Ao amanhecer, na penumbra insegura?
Negra,
noite, noites , enlaçadas
Quem
te criou ontem?
Saíste
do reino do xadrezes
E
venceste a complexa
Partitura
De
tuas vestes multicolores
Dos
brancos peões, bispos e rainhas
Dos
mates sem direções?
Negra, negra como a noite
Te procuro
Sou o dia do seu amanhã!
E tua consumação- à noite
Na noite que orvalhara carne
Sem aflitos ou aflições
Nos reinos de vidro de Iansã...
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