sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O QUE ESCREVO

Eu trabalho com o fluxo seminal de consciência. O fluxo de uma história que se dá no momento, onde o inconsciente dita até certo ponto o que devo escrever. A escrita que se dá o nome é automática. Até certo ponto eu a domino, e sou dominado por ela. É herança do Surrealismo, este que não morre com o tempo.


Depois quando no ato da criação se revela o modo assustador uma trama que se desenvolve aos poucos. Quase não há vestígios dela. Transmito assim uma surpresa iluminada, onde a metáfora reina e a metonímia é rainha.


As imagens se sucedem no ritmo. Tenho a partitura do que escrevo sendo derramado no texto. É certo que o texto deve se formar para iludir, para concatenar idéias, mas como disse um poeta simbolista, com grau de clarividência, Estéphane Mallarmé, a arte da palavra se faz com palavras e não com idéias.


É a linguagem que está em jogo quando escrevo algo. A solicitude de caracterizar no mínimo o máximo. Informação, acho, não existe nesse mundo onde a palavra impera e se situa; como via de regra a informação, do tipo jornalístico, ou com a máxima pretenção de uma natural sobriedade e separação entre o seu criador e o criado tentam existir na verdade não existem. Assim o criador dá os seus palpites, mesmo sendo na terceira pessoa. E leva o leitor por redes de significação a querer transmitir e fazer crer em algo.


Toda postura de escrita é política e ideológica, serve – se do interlocutor, serve –se de quem produz a mensagem. Não há impassibilidade no que se escreve. Há comprometimento. E o faço com a prosa poética, com os signos que me vêm a mão no mesmo instante do que eu escolho ou descarto. Por isso o que escrevo está completamente inserido no mar de opostos, na conjunção de signos, que superpostos, vão dizer ao leitor que a história antes de tudo não é informação simplesmente. É arte mais do que naturalmente. É a busca do plano arquetípico por excelência. A busca da imagens que Jung mostrou que vivem na nossa vida pelos lados do inconsciente coletivo. É isso que busco.


O diálogo que tento com o leitor faz dele uma pessoa, não simplesmente um acessório, receptáculo de informação. Clarice faz o mesmo com suas história que nascem do nada e de tudo, que constitui a busca do ser na sua poesia. A construção ontológica da eterna dúvida que aciona um gatilho na subjetividade do seu leitor. Nada é tão certo que deva ficar imune às perguntas de onde viemos, quem somos, para onde vamos. Nada é tão certo como a literatura que vira poesia e a poesia que vira filosofia. Filosofia da linguagem por excelência, por fim.

Um comentário:

carmen silvia presotto disse...

Eis o Ser da Linguagem, um eterno tempAço!!!

Que bom te ler, Nestor!

Um abraço carinhoso.

Carmen Silvia Presotto